LinkedIn não é Tinder

Foto_PaulaSanches copy

Sem rodeios, vamos falar sobre feminismo. De novo. Alguns revirarão os olhos em sinal de falta de paciência mas muitos mais, assim espero, se ajeitarão animados na cadeira porque precisamos, ainda, falar muito sobre isso.

Quero resgatar um caso que aconteceu uns bons meses atrás, quando uma advogada do Reino Unido resolveu mudar sua foto no LinkedIn após receber uma mensagem de outro advogado, bem mais velho que ela, a elogiando pela aparência. Mais uma vez, ressalto que isso foi no LinkedIn, não no Tinder. Ela deu um chega pra lá no cidadão e jogou a meleca toda no ventilador. Numa tradução livre, a troca de mensagens foi a seguinte:

Moço sem noção: Sei que é provável que esta mensagem seja muito politicamente incorreta, mas sua foto é deslumbrante.

Moça assediada: Estou no LinkedIn para fins profissionais e não para ser assediada sobre minha aparência física ou a ser objetificada por homens sexistas. A erotização da aparência física das mulheres é uma forma de exercer poder sobre elas. Ele silencia as qualificações profissionais das mulheres quando sua aparência física torna-se o assunto. Este comportamento é inaceitável e misógino. Pense duas vezes antes de enviar a outra mulher (com metade da sua idade) uma mensagem tão sexista.

O que se seguiu depois foram as reações que vemos sempre. Muitas mulheres apoiando e denunciando a quantidade de mensagens inapropriadas que recebem pela mesma rede voltada ao mundo profissional e muitos a chamando de “feminazi” e acusando sua reação de exagerada, afinal, aquilo era “só um elogio”. Queridos, com 40 anos de vida vividos como mulher eu lhes digo: não, não é elogio. É assédio e é um saco!

Hoje em dia se fala muito mais sobre isso porque anteriormente aguentávamos caladas todos os pequenos e grandes assédios. Éramos levadas a acreditar que era normal, afinal, era só um elogio. Agora, não mais. Estamos nos encorajando a falar e a falar cada vez mais, umas apoiando as outras. E não pense que a coisa acontece quando estamos na balada, arrumadas e tudo mais. Acontece lá, mas também acontece quando estamos indo na padaria vestindo moletom, blusa velha e crocs, às 7:30 da manhã. E acontece quando estamos colocando nosso perfil numa rede social voltada exclusivamente, ou assim deveria ser, a contatos profissionais. Ao pesquisar para lembrar dos detalhes desse caso eu fiquei horrorizada ao ver o número de mensagens de baixíssimo calão que são enviadas a muitas mulheres. E fiquei triste ao ver que muitas acabam colocando uma foto em que aparecem feias, com o intuito de parar esse tipo de assédio. No LinkedIn, não custa lembrar mais uma vez.

O tal sujeito do caso citado se defendeu dizendo que não agiu com más intenções e que achou a divulgação do caso exagerada. Honestamente, tenho até boa vontade em crer que ele não era nenhum maníaco correndo atrás de mulheres. Tem mais idade e provavelmente foi criado assim, achando que esse é o comportamento normal e esperado de um macho de respeito. Mas isso não é desculpa. Conseguimos crescer e aprender, ou melhor, desaprender comportamentos errados.

Para saber se você está elogiando ou assediando, faça um simples exercício: você diria a mesma coisa para uma pessoa do sexo oposto, na mesma situação? Será que o cidadão em questão mandaria a mesma mensagem a um homem, simplesmente para elogiar sua aparência? Acho que não né. Então. É assédio.

Outro dia eu estava assistindo uma das entrevista pós deflagração de operação. Não vou entrar em detalhes, mas vocês devem saber do que se trata. Pois bem, tudo indo dentro do esperado, detalhes sendo explicados, até que o procurador solta a pérola “vamos chamar as mulheres da equipe que embelezam a nossa operação…” e eu me contorci num sonoro NÃÃÃÃÃÃÃÃOOOOOOOO! Mais uma vez, e mais uma vez honestamente, chego a acreditar que ele fez isso achando que estava lotado de boas intenções, mas não é assim que se trabalha, moço. Usando novamente o raciocínio reverso, por acaso ele elogiou o delegado, dizendo que era bonitão ou que era o mais perfumado da diligência? Então. As mulheres que estavam lá também ralaram, prestaram concurso, se especializaram. Se usam calcinha, cueca, nada, não importa. Isso não tem e não deve ter a menor relevância. A única coisa que deve ser levada em consideração é se são seres capacitados e aptos a ocuparem seus cargos.

Precisamos falar muito sobre isso e, quem sabe, até exagerar mesmo, porque essa questão ainda está muito entranhada em nossa sociedade. Enquanto alguém responder “foi só um elogio”, chefes continuarem a apresentar funcionárias como itens que embelezam o departamento ou entrevistadores continuarem a perguntar às mulheres se desejam ter filhos, significa que estamos longe ainda de um ambiente de trabalho igualitário e profissional no sentido mais estrito da palavra.

 

Sobre a autora:

Paula Sanches – parceira RH|PM

Formada em Comunicação Social, é do tempo em que não se tinha nem computador na firma pra todo mundo. Começou como estagiária pegando café e “tirando xerox” e seguiu pelo mundo corporativo até a empresa em que estava falir. Continuou por conta própria entre freelas e novos projetos e escrevendo umas coisinhas aqui e acolá, até que veio parar aqui para contar histórias e dar suas opiniões sarcásticas sobre o mundo corporativo, mesmo sem ninguém pedir.

Crédito de Imagem: steve-lovelace.com


0.00

5 thoughts on “LinkedIn não é Tinder”

  1. Bom, também acho um exagero tais considerações.
    Não há nada de mal em elogiar a beleza alheia, mesmo sendo em um ambiente profissional.

    1. Sim Silvio Hemano, há problemas sim. Em ambiente de trabalho se observa competência profissional. Mulheres estão cansadas de ter que “provar” e se dedicar o dobro ou o triplo para que sua competência seja reconhecida.

  2. O cara não a chamou para sair, não foi agressivo, não foi vulgar, e fez um elogio muito delicado e rebuscado. E você vem falar em erotização??? Ah, dá um tempo com esse mimimi!!!! Qual vai ser o limite de vocês? Vocês querem tudo, podem tudo, e nós homens estamos ficando cada vez mais limitados, tolidos… Aposto que, mesmo a mais agressiva feminazi, gosta de receber um elogio, seja vindo de um homem ou mulher, dependendo de sua opção. Por favor, tenha mais imaginação na escolha dos temas, esse já deu…

    1. Querido (mas não muito) André:
      Vamos lá:
      – Em relação de trabalho não cabe elogiar beleza. PONTO. Você elogia seu estagiário quando acha que ele está bonitinho? Fala pro seu chefe que o cabelo dele tá mara? Fala que a bunda do seu colega de equipe fica linda na calça nova dele? Aposto que não.
      – Mimimi??? Hahahahahahaha!!! Claro, mas olha quem veio se dar ao trabalho de vir escrever um comentário para defender sua posição ameaçada de macho indefeso.
      – Feminazi, bla bla bla, elogio, bla bla bla… Elogios são diferentes de cantadas deselegantes e fora de propósito.
      – Sim, nós queremos TUDO, NÃO temos limites. Vamos brincar de ser hominhos agora, pra ver que gosto tem.
      – A coluna é MINHA, eu escolho os temas que EU quiser.
      Agora vai lá jogar um futebol bem macho com seus amiguinhos. E se não gostar de algo, ignore.
      Boa sorte nesse mundo, homão da porra.

Deixe uma resposta para Silvio Hemano Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *