Crianças grandes

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Quando me tornei mãe achei que estaria me isolando num mundo todo novo. Durante algum tempo foi realmente isso que aconteceu. Ficava lá no meu asteroide B 612 (Pequeno Príncipe feelings) onde só havia fraldas, mamadas e discussões seríssimas sobre consistência do cocô.

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Nada mais no mundo importava ou tinha qualquer relação com minha vida. Afinal, como o mundo corporativo poderia ter algo a ver com o horário em que eu dava as papinhas para o meu filho? Chefe? Esquece (eba!).

Os anos foram passando (no meu caso, quase 7) e meu rebento foi crescendo. Fomos conquistando cada nova etapa entre escolinha, interação com outras crianças e aprendizados, que inevitavelmente nos colocam em situações sociais com outros pais. Alguns você conhece de porta de escola, com outros acaba tendo um entrosamento maior e de outros acaba fugindo, pois não quer seu filho perto do filho deles pois a criança é mimada/agressiva/chora por tudo/desobediente/faz da vida do seu filho um inferno. Como é difícil disciplinar uma pessoinha. Que responsabilidade! E aí eu comecei a ligar os pontos. Sabe aquele pai todo folgadão, que não respeita os locais de estacionamento da escola, não cumpre os horários e tudo mais? E aquela mãe que diz sim para tudo que o filho quer? E o outro que não consegue sair sozinho com uma criança de 2 anos sem ter a ajuda de pelo menos mais um adulto, falando o que ele deve fazer? Então. Imagina como são os filhos deles. Agora imagina esses filhos daqui uns bons anos. Sabe onde estarão? Trabalhando, muito provavelmente num cargo bem perto de você.

Você acompanha o perfil dos pais, vê o perfil das crianças e percebe que é óbvio o desenrolar dos acontecimentos. Não quero aqui ser a arrogante que aponta o dedo na cara de todos, muito pelo contrário. Batalho diariamente para corrigir meus erros e uma das maiores lições aprendidas foi a de que criar um filho é a arte de cuspir na testa. Tudo aquilo que eu condenava ou adorava criticar observando outros pais (principalmente quando ainda não tinha o meu) voltou bonitinho na minha cabeça. E aí né, cabeça baixa e pedido de desculpas a todos os colegas de função.

Dentre todas as besteiras que os pais podem fazer – e acredite, somos capazes de muitas! – uma em particular está gerando impactos em toda uma segunda geração. É a superproteção. Segundo entrevista publicada na revista Veja de 5 de agosto de 2015 com a ex-reitora de Stanford Julie Lythcott-Haims, o fenômeno começou principalmente no pós guerra com a geração que, influenciada pela contracultura, decidiu criar seus filhos de maneira totalmente diversa da praticada por seus pais. No lugar da extrema rigidez, mais amor, menos cobranças e mais compreensão. Só que em algum lugar do caminho ocorreram alguns exageros e o resultado foi uma leva de pessoas que não conseguem tomar decisões, são extremamente inseguras e possuem dificuldades de se adequar ao mercado de trabalho. São os “adultos-criança”, como ela os define. Essa geração hoje tem por volta de seus 35 anos e, adivinhe? Tem agora seus próprios filhos.

Apesar da entrevistada ser norte-americana e tratar sobre o que ela encontra e vive por lá, é fácil perceber que o fenômeno acontece largamente por aqui. Vemos desde estagiários que não conseguem ir além do que foi pedido, funcionários inseguros que se perdem e não sabem tomar decisões quando as coisas não saem exatamente conforme o planejado, até filhos superprotegidos que conseguem um cargo graças à influência de sua mãe ou pai.

É tarefa árdua achar o equilíbrio. Acredito que a superproteção vem com a melhor das intenções, mas o fracasso e a frustração fazem parte da vida e ensinam muito, e o caminho de construção de uma carreira é pleno deles. A luta por uma chance quando a relação candidato/vaga é surreal, a frustração por ver alguém menos qualificado que você ganhando uma promoção, saber lidar com o chefe exigente e nem sempre justo. Aposto que você consegue completar esta lista com muitos mais itens que já encontrou em sua vida profissional.

Conversei sobre isso com a consultora de empresas Célia Reis, uma super profissional, super experiente. “A única certeza que podemos ter é que, geração após geração, vamos lidar com diferentes situações que vão nos desafiar. Brigar e lutar não adianta. É bem mais fácil entender as causas raiz e lidar com elas de maneira equilibrada.”

Segundo ela, nossa situação atual é a do tudo junto e misturado. “Temos atuando juntas a geração que foi submissa e acha isso uma qualidade, a geração que se acha maravilhosa em tudo e não aceita nenhuma crítica pois ouviu do papai e da mamãe que são perfeitos e nunca tiveram limites, a geração que não toma decisões e, quem sabe, talvez ainda existam mais algumas que não foram catalogadas. Entender as causas de tais comportamentos e buscar um equilíbrio na maneira de lidar com todos eles nos diferencia da maioria, pois a única certeza que podemos ter é que somos movidos pelos desafios e a vida seria um tédio se todo mundo agisse exatamente como você quer e fizesse exatamente o que você manda! Será que teríamos evoluído tecnologicamente e emocionalmente em um mundo sem desafios? Hoje eu agradeço as diferenças!”

Pois é. No final das contas, a maternidade tem tudo a ver com o mundo corporativo. Da minha parte, vou me esforçar bastante para que meu filho cresça curioso, confiante e saiba lidar com as diferentes emoções que tornam nossa vida interessante, seja no campo pessoal ou profissional. E vou continuar estacionando apenas em local permitido.

 

Sobre a autora:

Paula Sanches – parceira RH|PM

Formada em Comunicação Social, é do tempo em que não se tinha nem computador na firma pra todo mundo. Começou como estagiária pegando café e “tirando xerox” e seguiu pelo mundo corporativo até a empresa em que estava falir. Continuou por conta própria entre freelas e novos projetos e escrevendo umas coisinhas aqui e acolá, até que veio parar aqui para contar histórias e dar suas opiniões sarcásticas sobre o mundo corporativo, mesmo sem ninguém pedir.

Crédito de Imagem: Pixabay


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